Estudo inédito mapeou ecossistema existente no Nordeste do Brasil e mostra que poluição urbana e extração ilegal de corais ameaçam organismos.
Estudo inédito realizado que monitorou a saúde dos recifes de corais aponta que nos últimos 50 anos o país perdeu cerca de 80% desse ecossistema devido à extração e à poluição doméstica e industrial.
O restante existente está ameaçado pelos efeitos da mudança climática. O primeiro “Monitoramento de recifes de corais no Brasil”, executado de 2002 a 2010 pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), aponta os recifes que existem próximo a a grandes metrópoles do Nordeste, região onde se concentra esse ecossistema, são os mais prejudicados.
Os dados do estudo serão divulgados nesta segunda-feira (24) durante a sétima edição do Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, realizado em Natal (RN) pela Fundação Grupo Boticário.
Coordenado pela professora Beatrice Padovani, do Departamento de oceanografia da UFPE, o monitoramento constatou a presença de recifes de corais desde a costa nordeste do Rio Grande do Norte até o Sul da Bahia, se espalhando por cerca de 2 mil km do litoral brasileiro.
Os recifes de corais no país são ecossistemas costeiros compostos por ao menos 18 espécies diferentes de corais, além de algas e peixes como garoupas, peixes-papagaio e peixes-cirurgião. Podem ser encontrados até cem metros de profundidade ou na costa de grandes cidades, como Recife (PE), Maceió (AL) e Salvador (BA). Porém, constatar a presença de corais próximos às grandes capitais pode representar, em alguns casos, sua sentença de morte. Isso porque nessas regiões os recifes sofrem com o lançamento de esgoto não tratado direto no mar ou com a remoção ilegal de organismos.
“Os danos são causados por impactos de origem terrestre como a poluição doméstica, industrial e da agricultura, o aumento da sedimentação (envio de terra para o fundo do mar) causado pelo desmatamento da Mata Atlântica e dos mangues, além do fácil acesso que leva à retirada de organismos para construção, ornamentação e pesca”, disse.
Dados do estudo, baseados em pesquisas feitas anteriormente, mostram que em cinco décadas houve uma redução de 80% dos recifes de corais brasileiros. “Até a década de 1980, houve muita extração de corais para fabricação de cal no país. Essa remoção era feita com picaretas ou explosivos. Só houve uma redução após a criação de leis específicas”, disse Beatrice ao G1.
Outro problema grave que afeta esse ecossistema é a sobrepesca, que ameaça espécies de peixe que dependem desses organismos. Segundo a pesquisa, mesmo com a criação de unidades de conservação de proteção integral ao longo do litoral, peixes maiores e com ciclo de vida longo continuam a ser afetados, como a garoupa e o budião. “Como essas espécies têm papel fundamental nos recifes, controlando outras populações, (...) as consequências da redução de exemplares são a perda da resiliência do ecossistema, ou seja, a diminuição da capacidade de retornar ao estado anterior quando perturbado”, explica a pesquisadora.
Mudança climática pode afetar ainda mais ecossistema
Outro grande problema que ameaça os recifes brasileiros é o aquecimento dos oceanos, devido à elevação da temperatura global -- resultado da mudança climática. Eventos cíclicos de branqueamento e mortalidade de corais têm aumentado dramaticamente à medida que a temperatura do mar alcança valores mais altos e há maior ocorrência de eventos climáticos como El Niño (fenômeno caracterizado pelo aquecimento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico perto dos trópicos). A acidificação dos mares, consequência das emissões de carbono da atmosfera, é outro fator agravante. A água capta esse carbono e se torna mais ácida.
Desde Atol das Rocas, no Rio Grande do Norte (primeiro ponto amarelo no topo do mapa), até Abrolhos, no Sul da Bahia (último ponto azul do mapa). Monitoramento englobou 2 mil km de recifes de corais. (Foto: Divulgação) |
De acordo com a pesquisadora, o Brasil foi bastante atingido por branqueamento em 1998, 2003 e 2010. Em 1998 e 2010, 50% da população de corais ficou branca, mas a recuperação foi considerada boa – apesar de reduções localizadas de cobertura. “Em 2012, é provável a ocorrência de um novo El Niño. Os recifes que vão sofrer mais serão aqueles em pior estado de conservação, afetados pela poluição, e que podem ser afetados por doenças”, explica.
Unidades de conservação protegem organismos
O estudo diz ainda que os recifes de corais mais protegidos no Brasil são aqueles localizados dentro de unidades de conservação, como no Arquipélago de Fernando de Noronha (PE). A pesquisa aponta para o poder público formas de aumentar a preservação deste ecossistema, como aumentar a recuperação de matas ciliares e controlar o manejo de bacias hidrográficas. “É preciso controle de poluição, turismo e pesca, proteção para os grupos de peixes mais afetados, incluindo as áreas de berçário e desova dessas espécies”, diz a pesquisadora. Ela cita ainda a importância de conservar as áreas de mangues, que têm ligação importante com os recifes – além de servir como ambiente alternativo para diversos animais e organismos marinhos ao longo de seu ciclo de vida. O programa de monitoramento será mantido pelo MMA, através do Instituto Chico Mendes (ICMBio).
FONTE: Texto de Eduardo Carvalho, do Globo Natureza, em São Paulo, disponível também aqui.