A Revista Horizonte Geográfico, da Editora Horizonte está trazendo nesta Edição 142, do mês de Agosto, uma reportagem especial sobre o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e a necessidade de criação de novas unidades de conservação na região como forma de proteger este lugar cheio de riquezas e história. O texto é de Joana Marins, que esteve em Caravelas e região no início do mês de Julho e junto com a equipe do Parque, avistou as belas baleias jubarte e esteve no Arquipélago. A repórter acompanhou também o grupo de estudantes do Qatar, que estavam na região para conhecer os manguezais. A viagem era uma parceria entre a organização não governamental CI (Conservação Internacional) e a fundação árabe criada pela princesa do Qatar, Sheikha Moza bint Nasser, e era uma pequena parte da peregrinação dos estudantes que terminaria no Rio de Janeiro, durante a conferência Rio+20. Visite também o Blog Horizonte e acesse, no conteúdo exclusivo online, os bastidores da viagem e as belas imagens produzidas. O texto da revista está aqui:
Abrolhos precisa crescer
A importância ambiental de Abrolhos é unânime, mas as formas de proteger o arquipélago estão longe de ser. Saiba por que a ampliação do Parque Nacional Marinho e a criação de novas unidades de conservação na região ainda não saíram do papel
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A lancha do ICMBio (Instituto Chico Mendes) sai da pequena cidade de Caravelas, no sul da Bahia, e entra no mar em alta velocidade. O destino é o Parque Nacional Marinho de Abrolhos, uma área de 88 mil hectares localizada a 70 quilômetros da costa e que abriga a mais rica região coralínea do Atlântico Sul. O fundo do mar é coberto por dezenas de espécies de corais coloridos, muitos deles só encontrados por aqui, com destaque para o coralcérebro, que tem a forma de um cogumelo gigante e pode atinge até 25 metros de altura e 50 metros de diâmetro. As estruturas de calcário que formam o conjunto de Abrolhos são relativamente recentes, com cerca de 7 mil anos de idade, quando o nível do mar se encontrava mais baixo do que o atual – em contraste com os ecossistemas de coral mais antigos existentes em outras regiões do planeta, muitos deles formados há mais de 50 milhões de anos. No litoral brasileiro, esses animais marinhos se beneficiaram da pouca profundidade na região do arquipélago, cerca de 30 metros (enquanto a média do Atlântico é de 3.300 metros), para se reproduzirem e crescerem, formando um rico habitat que abriga inúmeras espécies de peixes, como garoupas, badejos, vermelhos e muitos outros. Inclusive, fazem parte desse universo marinho 45 espécies ameaçadas de extinção, entre elas a tartaruga-de-pente e o gigantesco mero.
A embarcação leva mantimentos para os oito oficiais da Marinha que moram na ilha de Santa Bárbara, a única habitada próxima ao arquipélago de Abrolhos, composto por outras cinco ilhas de origem vulcânica. Entre os tripulantes está Édson dos Santos Alves, um monitor do ICMBio que ficará 15 dias longe da família e dos amigos em Santa Bárbara, fiscalizando e recebendo visitantes do parque, que vão desde turistas e mergulhadores até pesquisadores. Uma das funções de Edinho, como é chamado pelos amigos e colegas de trabalho, é cuidar da ilha Siriba, a única aberta à visitação do arquipélago. Nenhum ser humano mora nem dorme ali; apenas as aves atobás (espécie de símbolo da ilha), granzinas, fragatas e beneditos permanecem no lugar ao fim do dia. “A minha principal função é assessorar o pessoal a não fazer coisas erradas, como cuidar para que ninguém pise nos ovos das aves ou mesmo em um filhote”, explica o guia. E acrescenta: “A beleza da Siriba é grande, mas o lindo mesmo está no fundo do mar”.
De fato, não é preciso mais do que um simples snorkel e uma máscara de mergulho para perceber que estamos em um ambiente único. “Quando olhamos para baixo da água vemos uma variedade de vida impressionante já bem próxima da ilha. Por isso, todo o cuidado é pouco para não tocar nesses corais que são frágeis e demoraram milhares de anos para crescer”, alerta Ricardo Jerozonlinsky, diretor do parque, aos primeiros que se lançam na água.
Paraíso dos corais
O Parque Nacional Marinho dos Abrolhos representa apenas 1,5% do Banco dos Abrolhos, uma gigantesca estrutura coralínea que se espalha ao longo de 46 mil quilômetros quadrados de extensão do sul da Bahia até a altura da foz do Rio Doce, no Espírito Santo. Por aqui vivem 19 das 21 espécies de corais já identificados na costa brasileira. Em abril, a revista científica Plos One publicou um artigo que revelava que Abrolhos abriga o maior banco de rondolitos do mundo. Rondolitos são algas calcárias feitas de carbonato de cálcio, que ajudam a capturar o gás carbônico da atmosfera. Na região em torno ao parque, essas estruturas calcáreas se espalham por cerca de 20 mil quilômetros quadrados de extensão, um tamanho equivalente ao do Estado de Sergipe. Por essas e outras razões é que pesquisadores de diferentes partes do mundo visitam Abrolhos todos os meses, buscando identificar, conhecer e investigar a fisiologia e os hábitos da vida submarina da região.
Alguns desses animais estão aqui “só de passagem”, como as baleias jubarte, que usam as águas quentes de Abrolhos para se reproduzir e amamentar. De julho a setembro é possível ver esses cetáceos gigantescos exibindo as suas caudas ou saltando em ruidosos voos acrobáticos. A presença desses grandes mamíferos na região incentivou o ICMBio e a organização não governamental Conservação Internacional a elaborarem, juntamente com outras ONGs e com o apoio de pesquisadores, uma proposta de ampliação do Parque Nacional Marinho de Abrolhos, além da criação de novas unidades de conservação na região. O objetivo da ampliação é claro: aumentar a proteção à biodiversidade marinha e à avifauna do Atlântico Sul, restringindo algumas atividades de exploração da pesca e, eventualmente, de petróleo em determinados locais, já que um eventual derramamento de óleo pode significar a contaminação de uma vasta área.
A lancha que deixa Edinho em Santa Bárbara trará de volta ao continente a outra monitora ambiental do ICMBio, Maria Bernardete Rosa, que ficou quase 20 dias trabalhando no arquipélago. Berna, como é conhecida na região, chegou quase por engano na ilha militar, em 1988. Acompanhando o marido na aventura de trabalhar para os oficiais da Marinha, a então jovem estudante de pedagogia se apaixonou pelos atobás e, principalmente, pela vida marinha do lugar. Com o tempo, se tornou especialista em mergulho livre, alcançando até 25 metros de profundidade sem o auxílio de cilindro de ar. Atualmente, além de realizar as funções de monitora ambiental ela faz pesquisas no parque. “Passo o máximo de tempo possível aqui. Abrolhos já faz parte da minha vida e nem sei mais como me desligar agora. Cuidar e estar em um lugar desses é um privilégio”, afirma.
Mas a ampliação do parque não está livre de contradições ou questionamentos – não da necessidade da proteção, mas da forma como ela pode se dar. E uma das frentes mais atuantes se encontra bem próxima dali, juntos às comunidades pesqueiras que tiram o sustento de suas famílias lançando redes sobre a grande estrutura coralínea.
Du Pescador, como o próprio nome sugere, vive da extração de camarão e da pesca em Caravelas. Coordenador da colônia de pescadores da cidade, que reúne 1.350 moradores, há 35 anos Du passa boa parte dos dias dentro do seu barco, em alto-mar. Ele conta que entre os meses de maio e junho a comunidade pesqueira da área chega a alcançar uma produção de 120 quilos de camarão por dia. Além do crustáceo, a região também é rica em peixes de diferentes tipos. A pesca praticada em Caravelas é artesanal, feita com rede de arrasto ou linha, e não é considerada predatória. “Nós temos muito respeito pela natureza. Aprendemos isso desde cedo. Faz parte da tradição, que passa de pai para filho”, afirma o pescador. Assim como o coordenador, pelo menos mais 20 mil pessoas dependem da pesca no entorno do Parque Nacional Marinho e a atividade de todos rende cerca de R$ 100 milhões por ano.
FONTE: Conteúdo disponível aqui.
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